numa de minhas fugas perdido num sebo local
entre vários outros vinis encontrei o réquiem do fauré
era uma tarde chuvosa sem nada
os escolares a me distrair pensando metafísica
o propósito inconsciente era ter como moer e preparar meu próprio café
e um vinil do johannes brahms
eu pronunciou exatamente assim johannes brahms em alemão
e tu debocha de mim
o que eu não gosto em ti pergunto
Mês: maio 2019
Sabemos que, no Maio de 68, Jean-Luc Godard confirmou uma suspeita que tinha: de que a sala de cinema era, em todos os sentidos da palavra, um “lugar errado”, ao mesmo tempo imoral e inadequado. Espaço de histeria fácil, da imunda paquera do olhar, do voyeurismo e dá magia. O lugar onde, para retomar uma metáfora que teve seu momento de glória, vínhamos “dormir no plano leito” para empanturrar ao máximo a vista e desse empanturramento ficar cego: ver muito e mal.
Nunca escondi de meus alunos que levei nove anos para me formar, ou seja, jubilei. O curso era de quatro anos e não consegui cumpri-lo nos outros quatro restantes.
Não irei elencar os motivos das reprovações, que seriam muitos, nem todos justificáveis. O que sei é que fui da primeira turma, a universidade não tinha quadro próprio, e tivemos professores convidados, aulas com: Luiz Carlos Estevam (USP); João Carlos Kfouri Quartim de Moraes (UFSCAR); Márcio Damin Custódio (Unicamp), entre outros…
Depois que me formei é que realmente comecei a redimensionar minha graduação; isso aconteceu ao preparar minhas aulas.
Olhando retrospectivamente, no momento em que a disciplina (que é a única que contém disciplinas – não canso de repetir isso para meus alunos dos cursos iniciais) – está em vias de sair do currículo escolar, me comove lembrar que esses anos no ensino médio, nos serviram para despertar o interesse pelas coisas do espírito, pela importância das ideias, e por nossa capacidade especulativa.
Daqui para frente, a filosofia ficará para os acadêmicos ou para os diletantes, as gerações que virão não saberão o que perderam como também não sabia nos meus anos escolares de ditadura militar. Vou sentir muita falta das exposições e diálogos que realizamos em sala… Ler filosofia solitariamente sem poder compartilhar é algo que não faz sentido, isso aprendi com meus alunos no ensino médio e não irei esquecer.